segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010

Idoso chama polícia por causa de beijo lésbico no Leblon

O preconceito atravessou o samba no fim do carnaval no Leblon. Incomodado com um beijo entre uma estudante universitária de 18 anos e uma adolescente de 17 no fim do desfile do bloco Mulheres de Chico, na Praça Antero de Quental, sábado à noite, um morador chamou a polícia alegando suspeita de pedofilia e deu início a uma grande confusão que terminou na 14ª DP (Leblon).

Depois de verificar a situação no local, o soldado Abílio Cezar Lima Cabral, do 23º BPM, tentou explicar ao idoso que um beijo entre duas mulheres não seria caso de polícia. Foi o suficiente para o tal morador acusá-lo de "corpo mole" e "prevaricação". Para encerrar o assunto, Abílio resolveu levar todos à 14ª DP. Nesse momento, foliões do bloco se revoltaram e outras patrulhas foram acionadas para conter o tumulto.

Entretanto, aconteceu o contrário e sprays de gás de pimenta foram lançados pelos policiais para acalmar a multidão. No tumulto, Abílio foi empurrado e acabou atropelado por um táxi, quebrando tornozelo esquerdo. Para o PM, toda confusão poderia ter sido evitada:

— Tentamos explicar ao senhor que aquilo era uma coisa comum nos dias de hoje. Eu mesmo não me importo. E repudiar é cirme de homofobia. Mas ele nos acusou de corpo mole e resolvemos fazer o procedimento até a delegacia. Aí foi a vez de o restante do público se revoltar. Ficamos em uma sinuca de bico.

Nem pedofilia, nem homofobia
Na 14ª DP (Leblon), o delegado Gustavo Valentini explicou que as duas jovens não foram indiciadas porque não houve corrupção de menores. Da mesma forma, também não foi indiciado o homem que denunciou o suposto ato de pedofilia. O delegado afirma não ter encontrado qualquer ato que o incriminasse por homofobia.

— Não houve por parte do denunciante qualquer ato que pudesse ser caracterizado como infração ou mesmo homofobia — disse o policial.

Assustada, a universitária lamentou a dimensão que o caso tomou e o preconceito no episódio.

— Foi um beijo como qualquer outro de carnaval. Não precisava disso. Foi uma atitude homofóbica que causou uma grande confusão desnecessariamente — disse a estudante, que pediu anonimato.

A confusão terminou com um soldado fora de combate e dois homens, Vinícius Soares Vilar, de 30; e Gustavo Campello Rodrigues, de 27, indiciados por desacato, desobediência e resistência à prisão.

Moradores e frequentadores criticam idoso
No dia seguinte, o beijo da discórdia causou indignação de moradores, trabalhadores e frequentadores do Leblon. Não pelas jovens, mas pelo preconceito e pelo deslocamento de equipes da polícia por causa de um romance homossexual.

— Acho ridículo um senhor se sentir incomodado com um beijo entre duas mulheres. Se não era a filha nem a mulher dele, o que ele tinha a ver com isso? Para que chamar a polícia? É proibido o homossexualismo? Ele sim que deveria ser preso por discriminação — criticou a publicitária Carmem Gomes.

— Homossexualismo não é crime, mas homofobia sim — resume o estudante Orlando Lossaco, de 18 anos, morador do bairro.

"Deve ser um senhor muito implicante"
Frequentador do Leblon, o cantor Maurício Jorge engrossa as críticas:

— Foi uma bobagem dele porque elas não fizeram nada de mais. Elas se beijaram. E daí? Deve ser um senhor muito implicante, uma besta. Ele não tinha nada com isso. E há coisas piores por aí.

— Não estou de acordo com isso, de mulher e homem se beijar, mas chamar a polícia? Estou cansado de ver isso na praia. Cada um faz o que quer. Com tanto bandido solto por aí e o cara liga para a polícia por causa disso? Devia estar doidão — disse o porteiro Antônio Ribeiro.

Para o estudante universitário Pedro Segadas, morador do bairro, o caso revela marcas de preconceito no Leblon:

— Existe preconceito sim, mas dos mais velhos. Não havia necessidade disso tudo para algo tão tolo. Ele poderia simplesmente ter pedido a elas que não se beijassem.

"O Leblon é uma aldeia"
Presidente da Associação de Moradores do Leblon e do Conselho Comunitário de Segurança, Augusto Boisson criticou o preconceito e a mobilização policial para impedir que duas mulheres se beijassem.

— Não era preciso recorrer à força policial para um caso desses. Esse senhor deveria se preocupar com outras coisas. E pedofilia é algo totalmente diferente. Houve preconceito e um grande exagero. A polícia tem muito mais o que fazer com o efetivo reduzido que tem — disse Boisson.

O presidente da associação foi além e admitiu a existência do preconceito no bairro. E citou a vizinha Ipanema, que tem uma rua, a Farme de Amoedo, conhecida como o mais famoso point gay da cidade, como parâmetro para comparação:

— Se fala muito que a Zona Sul tem a cabeça aberta, mas o preconceito no Leblon é muito comum. Em Ipanema, separada da gente apenas pelo Canal de Allah, isso não causaria problemas. O Leblon é mais mais voltado para o seu próprio umbigo, não gosta de blocos e nem é cosmopolita como Ipanema, que é um bairro gay. Eu não sou preconceituoso, mas o morador daqui é. Infelizmente, o Leblon é uma grande aldeia.

fonte: Extra

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