No mesmo dia em que foi apresentado com festa ao Camp Nou, Neymar teve o nome envolvido em sua primeira polêmica em terras espanholas. O jogador do Barcelona é acusado pela associação "Observatório contra a Homofobia na Espanha" de ter estrelado uma campanha publicitária que ofende a comunidade gay.
"É uma peça ofensiva, e qualquer pessoa com algum discernimento pode perceber", afirmou Eugeni Rodríguez Giménez, 45 anos, 29 deles dedicados à luta pelos direitos dos homossexuais na Espanha. Presidente e fundador do Observatório, ele encontrou a reportagem do UOL Esporte no centro de Barcelona hora depois de Neymar assinar contrato com o Barça.
> Lupo nega que seu comercial com Neymar seja homofóbico
A peça em questão é uma propaganda da marca de roupas íntimas Lupo, que já havia sido alvo de protesto do movimento gay brasileiro quando foi lançada há algumas semanas. Nela, Neymar aparece se exibindo só de cueca para algumas mulheres em uma loja, mas foge quando o cliente é um homem. O tom do anúncio é jocoso.
"Imagine se, ao invés de um homem, ele tivesse fugido de uma mulher negra, de um deficiente, de alguma outra minoria", argumenta Giménez. "Seria um escândalo. Mas como se trata de um gay, as pessoas tendem a aceitar a frivolidade, a piada, a banalização da ofensa." A Lupo nega que o personagem retratado na propaganda seja homossexual.
Diante da polêmica levantada nas redes sociais brasileiras, a empresa soltou uma nota oficial afirmando que a peça não é preconceituosa e com intuito era apenas fazer humor. Para o ativista espanhol, a justificativa, além de falsa, não é suficiente. Neymar, em sua visão, por ser a figura midiática e influenciadora que é, deve vir a público se desculpar e se engajar numa campanha anti-homofobia.
"Quando um fato dessa gravidade acontece, você não pode se omitir. Ele chega a Barcelona, que aos poucos reconhece a importância de garantir os direitos das minorias, com um peso muito grande. Chega carregando a cruz da homofobia. Ele precisa ser cobrado a se posicionar sobre essa tipo de questão."
Mais que um time
O Barcelona, como se sabe, é mais que um time. Na Catalunha, é, em alguns aspectos, uma instituição mais importante que a maioria das outras. Não se trata apenas de futebol, mas da fundação de uma identidade comunitária cujos principais atores (jogadores, técnicos, dirigentes, torcedores) podem influenciar o modo de vida das pessoas.
Neymar, como também se sabe, foge de polêmicas como o diabo da missa, razão pela qual não se sabe muito sobre seu posicionamento diante de questões sensíveis ao mundo moderno. Essa postura, aposta Giménez, se tornará um problema a médio prazo.
"Ele precisa entender o tamanho de ser jogador do Barcelona", pontua o ativista. "Não se trata apenas de jogar bola. Você tem que se posicionar. E ele tem a chance agora de falar aos seus fãs, às crianças que o admiram, sobre o combate à homofobia no esporte."
Assim como não costuma guardar posição dentro das quatro linhas, o atual herói do esporte brasileiro mantém discurso escorregadio sobre temas quentes, mesmo quando eles o afetam diretamente.
O torcedor santista não deve ter se esquecido de uma partida da equipe na Bolívia, pela Libertadores, em 2012, em que Neymar foi alvo de pesados insultos racistas. Um ano antes, jogando pela seleção brasileira, no Reino Unido, chegaram a lhe atirar bananas, gesto preferido dos racistas do futebol europeu.
Talvez por isso, em sua primeira entrevista coletiva com a camisa azul-grená, Neymar tenha sido questionado se temia o recrudescimento na Europa do racismo no futebol. Ele, porém, minimizou os incidentes que a própria Fifa vem se esforçando para combater. "Acho que está acabando, não me afeta", respondeu o atleta.
Giménez, engajado numa tentativa de mudança na legislação espanhola para punir com mais rigor crimes contra a diversidade sexual e de gênero, acredita que o fato de Neymar fazer parte de uma minoria deveria encorajá-lo a defender as outras.
"Ele sabe que ele é importante, pelo salário que recebe, pela quantidade de pessoas que param para ouvi-lo, pela capacidade de mudar a rotina de uma cidade inteira. É preciso usar isso para se posicionar."
Saindo do armário
A homofobia no mundo dos esportes é um tema que ganhou temperatura há pouco mais de um mês quando o pivô Jason Colins se tornou o primeiro atleta em atividade em uma das grandes ligas americanas a sair do armário.
No futebol, o goleiro dinamarquês Anders Lindergaard, do Manchester United, escreveu no ano passado um libelo em favor do respeito à diversidade e da necessidade de o esporte ter um herói assumidamente homossexual.
Na Catalunha, o assunto causou comoção na comunidade LGBT quando, em 2011, o Barcelona anunciou que estamparia em seu uniforme a marca da Qatar Foundation. Os ativistas não aceitam o fato de a organização (e, por consequência, o time) estar ligada a um país que limita os direitos das minorias sexuais.
Vinte anos antes disso, a homofobia literalmente já havia se vestido de azul-grená quando membros de uma torcida organizada do Barcelona, a Boixos Nois, assassinaram a transexual Sonia no parque da Ciutadella. Por ter inspiração neo-nazista, a organizada está banida dos estádios, mas ainda mantém um site na internet e algum tipo de atividade residual.
Giménez diz que entrará em contato com a direção do Barcelona para ver que mobilização é possível fazer para levar o tema da homofobia aos torcedores. Seu objetivo é que Neymar fale sobre o assunto - muitos ativistas acreditam que o silêncio sobre o tema só alimenta o preconceito.
Já a Lupo, uma das doze empresas que compram de Neymar o direito de usar sua imagem para vender produtos, havia respondido da seguinte forma à polêmica em torno de sua peça publicitária:
"A Lupo vem a público para esclarecer que em nenhum momento promoveu qualquer tipo de preconceito ao levar ao ar o comercial de televisão "Aparecimento", estrelado pelo jogador Neymar e que divulga a nova coleção de cuecas da Lupo. Já na concepção do comercial, que está sendo veiculado no intervalo dos principais programas de televisão, o personagem alvo da polêmica não teve qualquer conotação homossexual. A graça do comercial é exatamente essa: um sujeito fortão, heterossexual, procura uma cueca sexy para usar – subentende-se – com uma mulher. E a reação de Neymar é sair de cena. A ideia foi dar um tom brincalhão e brasileiro ao filme.
A Lupo reitera sua rejeição a qualquer tipo de preconceito e garante seu respeito a todos os consumidores de seus produtos, independentemente de classe social, nacionalidade, religião e orientação sexual. A empresa fabrica produtos para todos os públicos e não faria o menor sentido excluir qualquer público de suas lojas e muito menos denegrir a imagem dos homossexuais".
fonte: UOL
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